O médico Richard Besdine escreveu um pequeno artigo chamado Late-Life Depression: Coming Out of the Shadows
no início do ano. A versão AOL do artigo começa perguntando se você
pode resolver uma charada: o que é que afeta um em cada cinco
americanos, aumenta o risco de morte e de incapacitação e duplica seus
gastos com a saúde?
Muitos
pensam em câncer ou doenças do coração, mas a resposta é dupla:
depressão e coração. Essas duas doenças têm muito em comum:
· Muitas vezes não são notadas e, com menor freqüência são diagnosticadas;
· Com menor freqüência ainda, são tratadas;
· Essas deficiências na detecção e tratamento são ainda mais graves entre os idosos.
O pior
inimigo das pessoas com depressão é tanto cognitivo quanto atitudinal. A
maioria dos brasileiros não sabe o que é depressão. Outra grande ameaça
vem da “normalização”, de achar que é normal que idosos e/ou doentes
estejam deprimidos.
Esta
incompreensão do que é depressão, do que é doença e do que são a
Terceira e a Quarta idades permite muito sofrimento e muitas mortes,
além do absolutamente inevitável. Os brasileiros poderiam sofrer e
morrer menos.
Não há
dúvida de que alguns aspectos da velhice, como o aumento das doenças
crônicas, a morte (com efeito cumulativo) de parentes e amigos, e o
crescente número de atividades que não podem mais ser feitas levam
muitos a achar que é normal que os “velhos” sejam deprimidos.
Mas, olha
a surpresa: em várias sociedades, pessoas mais jovens sofrem de
depressão com maior freqüência e intensidade do que os idosos. E,
acredite ou não, os idosos desenvolveram maneiras mais numerosas e
eficientes de lidar com problemas que poderiam causar depressão. Um
dado: a pobreza pode multiplicar a depressão tanto em idosos quanto na
população jovem e adulta.
O que provoca a depressão? Mais uma surpresa: pesquisadores na Washington University School of Medicine em St. Louis e no King's College em Londres chegaram à mesma conclusão: geneticamente, há uma combinação no DNA no cromossoma 3 associado com a depressão.
Uma de
cada cinco pessoas padece de depressão séria na vida. O que diferencia a
que padece das outras quatro? A análise da família revelou um histórico
de depressão em muitos dos que enfrentaram essa doença, mas em poucos
dos que não a enfrentaram. Há uma região no DNA com noventa genes onde
parece que essa predisposição se origina.
Mas,
cuidado: muitos com predisposição genética não se deprimem e alguns sem
ela ficam deprimidos. Não são populações “determinadas” pela genética a
ter ou a não ter a depressão. Esses dois artigos acabam de ser
publicados no American Journal of Psychiatry.
A
“normalização” da depressão mata muita gente, não apenas através do
suicídio, talvez a primeira causa que venha à cabeça de muita gente, mas
que não é a mais importante. Quem teve um ataque cardíaco e sofre com
uma depressão tem um risco de morte quatro vezes maior do que os que
também tiveram um ataque cardíaco, mas não sofrem (ou sofreram e já
controlaram) de uma depressão. Quatro vezes, 400%, não é pouco.
Parte da
diferença na sobrevivência entre os que sofrem de depressão e os que não
sofrem se deve à adoção de comportamentos negativos e prejudiciais á
saúde, como beber em excesso, fumar, comer pior que aumentam o risco de
várias doenças. Brenda Penninx e
sua equipe pesquisaram 6.247 pessoas com 65 anos ou mais que não
sofriam de depressão no início da pesquisa, que durou seis anos. Durante
esse período, quase quinhentas pessoas caíram em depressão. Um dos
resultados constatados foi um risco 67% maior de sofrer quedas e outros
acidentes do cotidiano e outro foi um risco 73% maior de ter a
mobilidade reduzida. Os maus hábitos, inclusive a ausência de
exercícios, ajudam a explicar as diferenças no grau de mobilidade entre
os deprimidos e os não deprimidos. Muitos deprimidos acabam se tornando
prisioneiros em suas próprias casas e não buscam outras pessoas, nem
quando necessitam. Suas redes sociais são mínimas. Além de deprimidos,
são solitários.
E há
custos: no Brasil, os pobres que padecem de depressão raramente são
tratados e sofrem e morrem como moscas. Nos Estados Unidos, onde uma
proporção mais elevada recebe tratamento, o custo da depressão anda
beirando os cem bilhões de dólares por ano – bilhões mesmo, não milhões.
O equivalente à soma do PIB da Bolívia, do Equador e do Paraguai!!!
É melhor começar a enxergar.
GLÁUCIO SOARES
IESP/UERJ